terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

 ADEUS, BELÉM HISTÓRICA


«O processo do edifício número 138 da Rua de Belém não consta hoje de qualquer arquivo camarário consultável. Em vão tentei localizá-lo, ao longo de meses, enquanto procedia à análise de todos os outros documentos referentes aos demolidos em 1939. Proprietários dos restantes prédios da Rua de Belém foram informados sobre indemnizações e prazos; mesmo quando os prédios eram propriedade municipal, o respectivo processo inclui documentos referentes às lojas locais. Porquê, então, esta misteriosa omissão do número 138?
Acontece que, confirmando aquilo que diziam as pessoas do burgo, a referida casa guardava, nos seus alicerces, ruínas históricas contemporâneas da antiga capela do Infante. Quando as demolições do quarteirão começaram, rapidamente foram postas a descoberto antigas abóbadas. Ordens superiores mandaram então suspender os trabalhos, permanecendo o pequeno edifício entre as ruínas dos seus vizinhos, enquanto se decidia o que fazer do achado. Nada transpareceu nos jornais, e a demolição acabou por consumar-se, pois já não havia tempo para alterar quaisquer planos. Uma imprevisível descoberta acabou por tornar claro aquilo que, à época, ainda seria discutível: que a homenagem à história pátria se fazia à custa do desaparecimento de testemunhos dessa mesma história. (...)


continua no livro

Forografia: Mestre Horácio Novaes, prova original da época.







quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Avenida Duque de Ávila


Lisboa já se estendeu para norte. Ao Passeio Público, a Avenida da Liberdade passara-lhe por cima para ir dar à Rotunda. A partir daí (menos ambiciosas na sua largueza), diversas avenidas se abriram e, a seguir à (mais modesta) rotunda do Saldanha, nelas outras se cruzaram: as Avenidas Novas. Como esta ainda tão pacata e quase provinciana Avenida Duque de Ávila que aqui vemos, já percorrida por eléctricos, cujos fios, porém, são consertados, ainda, por carros puxados a cavalo.

Puxada a cavalo segue também, na outra via, uma carroça. O mundo - dir-se-ia - caminhava em frente e direito a nós. Equilibrado, embora, em dois pés: o passado e o presente. No meio, estão as poucas gentes que passam, insensíveis decerto à concomitância da História. Só os dois miúdos estacaram. Olhos postos no fotógrafo e no futuro.