sexta-feira, 26 de julho de 2013

PRAIA COM VESTIÁRIO ÀS COSTAS

PHOTOGRAPHIAS DE VERÃO

de

MARINA TAVARES DIAS


 PRAIA COM VESTIÁRIO ÀS COSTAS


O barracão de madeira era imprescindível em qualquer praia. Foi-o até ao início do século XX. Começou por ser erguido sobre estacas, lançando pranchas sobre a água, porque os banhistas não queriam areia nos pés. A distância calculada, havia sempre mirones, no fito de verem as senhoras escorregar e estatelarem-se nos braços do banheiro. O António Maria, jornal humorístico dirigido por Rafael Bordalo Pinheiro, publicava hilariantes poemas estivais: «Afirma a D. Mafalda/ Que o brejeirete do Henrique// Tem uma pecha, uma balda:/ Esburacar o tabique,/ Ver as banhistas em fralda!// E não lhe escapa nenhuma/ Do feminino rebanho!/ Tem-nas visto uma por uma!/ - Se ele até não vai p'ra o banho/ Sem se munir de verruma!// [.../...] Bispa uma perna... Oh! ventura!/ Que perna arrebatadora,/ Da mais delicada alvura./ - Deve ser duma senhora/ De respeitável altura!...// Tosga um joelho... Que bom!/ Na forma e beleza rara/ Mostra que é dama de tom.../ Mas nisto, vendo-lhe a cara,/ Solta um grito...Era o Brion!...»

Nas duas primeiras décadas do século passado, o barracão de banhos dispensava já a prancha, mas continuava a zelar pelo recato de quem se despia antes do mergulho. Em meados de Agosto, antes da temporada alta, os banheiros desencantavam a velha construção riscada que estava a ganhar pó desde Novembro do ano anterior. E era vê-los pelas calçadas de Pedrouços e de Algés, de casa às costas e acompanhados pela Guarda, a preparar o conforto das praias. Pelo caminho, as ruas vinham à janela. 

(excerto de texto publicado na revista VISÃO)


quinta-feira, 4 de julho de 2013

A HISTÓRIA DO FUTEBOL EM LISBOA de MARINA TAVARES DIAS

«Todas as manhãs do mundo são sem retorno». Este livro nasceu com um espírito de missão. Talvez haja quem ache esta missão risível. Mas o que vão ver são heróis precários. Dos que jogam face-a-face com o mais terrível inimigo de todos: o tempo. Equilibram a vida no paradoxo de duas medidas: a vertigem do arremesso da bola e o longo clamor duma multidão sem rosto nem época. Existe neles a anuência tácita do retrato, porque é deles acima de tudo o segundo que a cada passo fica para trás. Aos 15 anos descobrem o futuro que aos 20 dominam. Aos 30 têm de ser sábios porque aos 40 serão velhos. Como a bola desferida contra a rede, cada dia passa sem remissão nem travagem. Estas fotografias são o duplo atestado da precariedade das vidas. Nelas reside o húmus da alegria de gerações inteiras de adeptos; gerações inteiras esquecidas do tempo. Aqui estão os heróis do mundo que passa. Aqui reencontramos a essência dos milagres que duraram a fracção de um segundo: o golo, a fotografia, a vida.»



 MARINA TAVARES DIAS


excerto de:


A HISTÓRIA DO FUTEBOL 

EM LISBOA